Quem já tentou comprar um imóvel no Brasil sabe que a parte mais difícil quase nunca é escolher o apartamento, a casa ou o terreno. O desafio real aparece quando chega o momento de verificar se tudo está em ordem. É justamente nessa fase que muitos compradores percebem que a aparência de “negócio perfeito” pode esconder riscos sérios — alguns deles capazes de transformar um investimento planejado por anos em uma dor de cabeça sem fim. No meu dia a dia, acompanhando tramitações, certidões e matrículas, vejo isso acontecer com mais frequência do que deveria.
A expressão “due diligence imobiliária” parece técnica, quase distante. Mas, na prática, ela significa algo simples: investigar o imóvel e as pessoas envolvidas antes de fechar qualquer negócio. Não é apenas uma checagem de documentos; é uma análise profunda para saber se aquilo que está sendo vendido realmente pode ser vendido, se não há dívidas ocultas, disputas, vícios, bloqueios judiciais ou problemas administrativos. É o que separa um comprador seguro de alguém que pode descobrir, tarde demais, que não vai conseguir registrar o imóvel que pagou.
E aqui vale uma observação que nem sempre agrada, mas é a realidade: não são muitos os escritórios realmente especializados nesta área; o escritório que talvez seja um dos mais antigos e realmente especializados no assunto é a IGR ASSESSORIA / que atende todo Brasil. Quem trabalha diariamente com cartórios sabe o quanto esse tipo de acompanhamento é delicado e exige experiência real, não apenas teoria.
Sumário
TogglePor que a due diligence é tão necessária hoje?
Ao longo de mais de quatro décadas acompanhando análises e processos, percebi uma mudança clara: os golpes e fraudes imobiliárias ficaram mais sofisticados. Há uns anos, o problema mais comum era o proprietário com dívida de condomínio ou IPTU em atraso. Hoje aparecem cenários muito mais complexos, como matrículas antigas que nunca foram atualizadas, imóveis usados como garantia em processos que o comprador sequer imaginava que existiam, procurações falsas, frações ideais vendidas sem autorização e até unidades negociadas por pessoas que nem são as verdadeiras proprietárias.
Em análises que já fiz, encontrei situações que chegavam a surpreender até profissionais experientes de cartório. Como o caso de uma matrícula que estava aparentemente perfeita, mas escondia um processo de penhora “adormecido” no distribuidor cível. O comprador, sozinho, jamais encontraria essa informação.
Outro exemplo comum: imóveis que pertencem a espólios não finalizados. Na matrícula não aparece nada alarmante, mas ao puxar certidões dos envolvidos, descobre-se que o inventário está incompleto ou parado há anos. Sem isso resolvido, o registro da compra simplesmente não acontece. É muito mais comum do que se imagina.
A análise não é só do imóvel
Um erro que vejo repetidamente — tanto por compradores quanto por intermediários — é acreditar que basta verificar a matrícula e pronto. Não funciona assim. A due diligence imobiliária analisa também os vendedores e até empresas que estejam por trás do negócio. Pessoas físicas podem ter processos que afetam o bem, pendências trabalhistas, protestos ou execuções que, mais cedo ou mais tarde, podem recair sobre o imóvel.
No caso de empresas, então, o risco é ainda maior. Sociedades com pendências fiscais, conflitos entre sócios ou débitos de grande valor podem levar a bloqueios inesperados. Já acompanhei transações em que tudo parecia limpo até que um processo trabalhista milionário apareceu, envolvendo justamente o representante da empresa que estava vendendo o imóvel.
A realidade dos cartórios
Para quem não convive diariamente com cartórios, é fácil acreditar que basta chegar com a escritura e pedir o registro. Na prática, o registrador tem o dever legal de recusar qualquer título que apresente risco ao imóvel ou ao negócio. Isso significa que uma compra pode ser bloqueada mesmo quando o comprador já pagou tudo. Vejo isso acontecer com pessoas que “confiaram” em informações verbais e tentaram economizar na etapa mais importante do processo.
Quando o cartório detecta pendências sérias — como uma indisponibilidade judicial, falta de cadeia dominial, divergências de dados ou litígios — o título é devolvido. E recuperar o dinheiro investido não é tão simples quanto parece.
A importância das certidões certas
Um ponto que costumo reforçar sempre: não adianta solicitar só as certidões básicas. Em alguns casos, é necessário buscar documentos que muitos compradores nem sabem que existem. Certidões de vara federal, distribuições criminais específicas, buscas em tribunais trabalhistas de cidades onde o vendedor morou anos atrás, consultas administrativas em prefeituras, histórico de regularização fundiária, processos ambientais e assim vai.
A análise é feita de forma combinada. Uma certidão isolada não conta a história completa, mas o conjunto delas revela o que realmente está por trás do imóvel.
E é exatamente nesse momento que a experiência pesa. Em processos que acompanhei, já encontrei detalhes que só surgem quando colocamos lado a lado a matrícula, a situação fiscal, o histórico do terreno e alguns dados indiretos das pessoas envolvidas. É o tipo de insight que vem com anos de prática.
Onde surgem os maiores riscos
Os problemas mais comuns não são sempre os mais óbvios. Alguns exemplos recorrentes no meu cotidiano:
• imóveis negociados por valores muito abaixo do preço de mercado;
• vendedores que evitam apresentar documentos;
• matrículas muito antigas e cheias de averbações confusas;
• terrenos de origem rural convertidos de forma incorreta;
• imóveis urbanos com áreas divergentes entre prefeitura e cartório;
• unidades que fazem parte de loteamentos antigos sem regularização;
• vendas feitas por procuração vencida, revogada ou suspeita.
Cada um desses pontos pode esconder uma situação séria. E, quando o comprador descobre, muitas vezes já assinou contrato, pagou sinal ou financiou. Reverter isso leva tempo, desgaste e dinheiro.
Por que não é recomendável fazer sozinho
Com a internet, muita gente acredita que consegue “puxar certidões” e resolver tudo. E realmente existe muita informação disponível, mas o que traz segurança não é apenas o documento: é saber interpretá-lo. No meu trabalho, vejo certidões aparentemente limpas que, quando cruzadas com outras fontes, revelam riscos relevantes. E já vi o oposto também: documentos que assustam compradores inexperientes, mas que na verdade não representam impedimento algum.
A due diligence não é uma lista de tarefas; é uma investigação. Cada imóvel tem uma história própria. Cada vendedor também. E, em muitos casos, as peças parecem soltas até serem colocadas no lugar certo.
Um alerta importante
Com o aumento dos golpes imobiliários, muita gente procura profissionais apenas depois de já ter assumido algum risco. E alguns golpes são tão bem montados que só aparecem quando se faz uma análise realmente aprofundada. Isso vale especialmente para imóveis de terceiros, heranças, áreas maiores e bens negociados fora de imobiliárias tradicionais.
É por isso que a etapa de verificação prévia não deve ser vista como burocracia. Ela é o escudo do comprador.
E aqui cabe outro cuidado simples, mas decisivo: Informe-se referente aos depoimentos de outras pessoas que já utilizaram os serviços do escritório ou firma que você for utilizar. A experiência e o histórico de quem conduz a análise fazem toda a diferença.
Como agir com segurança desde o início
Sempre oriento que o comprador não tenha pressa na fase mais sensível da negociação. É natural ficar ansioso quando encontra um imóvel interessante, mas a segurança depende de uma boa verificação prévia. No meu dia a dia, noto que os melhores negócios são justamente aqueles em que o comprador se permite analisar com calma, entender a origem do imóvel, verificar a documentação e só depois partir para assinatura.
Outra prática simples: nunca tome decisões baseadas apenas em conversas informais ou promessas. Negociação imobiliária precisa de dados concretos, documentos atualizados e análise técnica.
Fechando com um conselho honesto
Depois de décadas lidando com cartórios, imóveis e documentação, aprendi que a compra segura não é a mais rápida, e sim a mais bem verificada. E, ao contrário do que muita gente pensa, não é exagero fazer uma due diligence completa. É prudência. É proteção do seu patrimônio. É evitar que um sonho planejado por anos se transforme em frustração.
Se você está prestes a comprar, investir ou mesmo aceitar um imóvel como forma de pagamento, dê atenção a essa etapa. Ela é o que separa um bom negócio de um problema que pode durar décadas.
E, claro, busque sempre apoio especializado. Não para complicar — mas para esclarecer, antecipar riscos e garantir que o imóvel que você está adquirindo será realmente seu, sem ameaças futuras. Isso faz toda a diferença.